terça-feira, novembro 10, 2009
A propósito da
vinda recente de Karl Kerschl a Portugal, por ocasião do FIBDA, aproveitei para reler por inteiro a participação dele no Wednesday Comics, a minha favorita de todo o projecto.
O Wednesday Comics, para quem não sabe, foi uma série semanal em 12 números, lançada pela DC Comics, impressa em papel e tamanho de jornal, com histórias de vários personagens, contadas em capítulos de duas páginas. A ideia era reproduzir o efeito das antigas tiras de jornal, que nos EUA ocupavam uma página inteira aos domingos, mas dar-lhes um contexto moderno.
Alguns dos autores optaram por uma abordagem mais clássica, outros aproveitaram o formato para experimentação visual e narrativa. Nem todos foram bem sucedidos, mas quase todas as histórias tiveram algum ponto de interesse.
A Kerschl e ao seu colega Brenden Fletcher coube criar uma história do Flash, e em termos de abordagem, usaram um misto das duas, alternando um storytelling clássico com construção de página e temática mais experimental, passando inclusive pela divisão frequente da página em duas, com a metade superior atribuída ao protagonista, e a metade inferior entregue a outro personagem.
A história começa com o Flash a enfrentar o Gorilla Grodd que quer fazer… alguma coisa… Enquanto Iris West, a mulher do Flash, o deixa, despedindo-se com uma das tradicionais cartas usadas nessas ocasiões. Quando o Flash chega a casa, depois de aparentemente derrotar o vilão, encontra a carta, e decide voltar 10 minutos atrás no tempo, para chegar a casa a tempo de impedir Iris de o deixar. Só que ao fazê-lo, não só está a potenciar o verdadeiro plano de Grodd, como se encontra a ele mesmo, uma versão que ainda não tinha feito a viagem para 10 minutos antes. Ambos decidem trabalhar em conjunto, um para deter Grodd, outro para deter Iris.
Não vou descrever a história toda, basta dizer que as alterações à realidade e viagens no tempo depressa se multiplicam, de tal forma que rapidamente há umas boas dezenas de Flashes a trabalhar em conjunto. E a confusão é tão grande que, honestamente, a história não me pareceu fazer sentido nenhum. Achei-a bem executada, sem dúvida, e extremamente divertida, mas a lógica interna parecia estar a ser tratada com o mesmo descaso com que o Flash tratava a integridade do Contínuum Espaço-Temporal só para impedir que a mulher o deixasse.
Ao reler a história confirmei a minha impressão inicial. Não faz qualquer sentido. E não só constatei que isso é parte do que me atrai na história, como concluí que não é SUPOSTO fazer sentido, porque o motor da história é a necessidade central do protagonista, e essa vai contra qualquer lógica literal. Diria mesmo que essa necessidade é impulsionada pela falta de lógica.
O propósito da história é a reconciliação do Flash com a mulher. A história é feita das desesperadas tentativas dele impedir que ela o deixe, custe o que custar. O Flash não o diz literalmente, mas poderia tê-lo dito (e em última análise, acho que é isso que realmente gosto neste trabalho):
“Não me interessa que o Contínuum Temporal seja destruido, ou que o vilão ganhe, ou seja o que for. Nada disso interessa. O que me interessa és tu, e recuso-me a perder-te.
“Porque o Universo não faz sentido sem ti.”
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